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Foto do escritorRui Ferreira

Guerra do Ultramar: assunto esquecido ou proibido?

A questão surge do facto de, a guerra do Ultramar, ser o pano de fundo da história de “A vida numa cicatriz”. Muitos me questionam acerca dessa questão, alguns surpreendidos, porque aparentemente a guerra do ultramar não é do seu conhecimento, outros porque se indignam com a temática e não a querem discutir.


Não consigo deixar de ficar surpreendido, ou talvez não, com o grau de desconhecimento que muita da minha geração e todas as outras que a sucedem, têm acerca da guerra do ultramar. Não que desconheçam a sua existência, mas sobretudo, por desconhecerem quase tudo ou muito do que lá se passou e muito do que por cá se passou após ter terminado. Cá, agigantou-se uma outra guerra, passiva, fria, silenciosa, “envergonhada”, no subconsciente de muitos dos ex-combatentes, pelos quais tenho um profundo sentimento de respeito e consideração.

É um dado adquirido que quase todas as famílias portuguesas tiveram algum familiar, mais próximo ou mais afastado, que esteve presente nas ex-colónias, mobilizado em defesa da pátria (cerca de 90% da juventude masculina esteve lá presente durante os 13 anos de conflito).

Seria portanto normalíssimo, que a questão da guerra colonial fosse um assunto sobejamente conhecido e discutido, mas curiosamente, ou talvez não, não é.

É assunto tabu nesta nossa sociedade que está sempre pronta para discutir tudo e mais alguma coisa, excepto os assuntos incómodos ou mais sensíveis. Ao que parece não se pode ou não se deve dizer, nem mesmo em família, que 8.831 militares portugueses perderam a vida nas ex-colónias (dados do EMGFA), e que cerca de 100.000 ficaram feridos ou incapacitados.

Durante anos não se falava, a não ser muito superficialmente, dos traumas de guerra e das dificuldades que muitos dos ex-combatentes tiveram para se integrarem novamente numa sociedade que, aparentemente, apenas os queria esquecer.

O estado português, que tardiamente veio a reconhecer o sacrifício, que estes homens fizeram em prol de algo que, estou convicto, muitos desconheciam ou não percebiam quando foram mobilizados (reparem que os homens e mulheres dos movimentos que lutavam pela independência eram catalogados como terroristas e não como militares), continua em falta com os portugueses ao não promover a discussão acerca das razões, as verdadeiras razões, que levaram o país para este conflito, acerca de tudo o que foi feito no teatro de guerra e da famigerada descolonização, que não sendo nem um sucesso, nem um fiasco, foi a possível face à conjectura nacional e internacional.

Reconheço que o tema, da guerra nas ex-colónias não é fácil, não é consensual, mas é um facto insofismável, marcante da nossa história, que não deve continuar a ser “ignorado” e constantemente varrido para debaixo do tapete. Daí tê-lo trazido à liça como tema fulcral da história.

O país deve, à memória de todos aqueles que fizeram o supremo sacrifício, que o assunto seja discutido, debatido de forma séria e aprofundada, sem tabus. Deve aos que voltaram, o reconhecimento do seu esforço e a devida “compensação”, não só pelo que fizeram pela pátria, mas sobretudo pelo que passaram e passam, em consequência desse desempenho.

A chamada do tema à história teve isso como objetivo, ou seja, pretende que seja discutido, que seja dado a conhecer a todos quantos a ignoram, conscientemente ou inconscientemente, na certeza que deixou cicatrizes profundas na sociedade que precisam ser definitivamente curadas.

Também por isso, dediquei o livro, “A todos os ex-combatentes e em especial aos que fizeram o supremo sacrifício pela pátria.”

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